Após ter corrompido o presidente Ramalhete,
convencendo-o a autorizar a construção de um resort numa área protegida, o Dr.
Tomás Afonso, o autarca e o Comandante da GNR são levados pelos empreiteiros
Manuel e Joaquim Texugo a uma casa de meninas.
Na mesa dos sofás onde se sentaram, de frente para uma pista de dança com um varão no centro, bolas de espelhos e luzes vermelhas a catrapiscar no tecto, foram colocadas duas garrafas de whisky falsificado, um balde com gelo de água de um poço e copos que haviam sido lavados dentro de um bidão. Joaquim Texugo tirou os sapatos, serviu os amigos e bebeu pelo gargalo. Depois convidou-os a escolher algumas das meninas que estavam encostadas ao balcão ou passarinhavam de um lado para o outro, informando-os de que «já as havia corrido a todas para ganharem amor à casa». Mas, vendo-os indecisos, precisou as suas preferências «eu cá gosto delas cheiinhas, mas no fundo isto é um bicho que se aperta e chia».
E os bichos de Joaquim, soltos na selva do
alterne mas atraídos pela presença do dono e curiosos das suas amizades, não
pararam de desfilar rente à mesa lançando miradas concupiscentes, requebrando
as ancas e empinando as mamocas, fenómeno pantomímico e luxuriante que deliciou
o Dr. Afonso e levou o Presidente Ramalhete a deixar escapar o que lhe ia na
alma «estas moças de hoje estão muito bem alimentadas».
Entretanto, na pista de dança começaram a
abanar-se duas dançarinas, um pouco desengonçadas mas bem favorecidas pelas
benesses da natureza e rigor da alimentação. O show consistia num número de
striptease simultâneo, inventado pelas próprias depois de terem visto as provas
de natação sincronizada nos Jogos Olímpicos. Raras vezes conseguiam tirar as
peças de roupa ao mesmo tempo, cada uma dava passos diferentes, chegaram a
chocar com as cabeças e por vezes até discutiam durante o espectáculo. Mas nada
disto fazia diminuir o deslumbre do público masculino que, de boca aberta,
observava a performance feminina num silêncio reverencial de crentes diante de
uma epifania. Esse era o único momento da sessão durante o qual a vozearia se
calava e apenas se ouvia, de uma velha gravação riscada, je t’aime moi non plus.
Com efeito,
clientes que galhofavam ruidosamente, regateavam preços com as meninas,
confidenciavam-lhes as misérias domésticas ou os infortúnios profissionais,
escutado o anúncio do DJ de estar prestes a começar «o nunca visto show erótico
e selvagem de Liliana e Ludmila», emudeciam. Porque as artistas, mesmo estando
em cena há quase três meses e apresentando como única mudança a troca da
posição direita para a posição esquerda, detinham o misterioso poder de
enfeitiçar os fregueses do Foli Bergere. Poder
que talvez adviesse de estarem proibidas de se dedicarem a outras artes da
luxúria que não as do desnudar musical, enquanto durasse o aclamado show,
erótico e selvagem. Por isso, nas noites de Sexta e de Sábado a imaginação dos
clientes desvairava, por culpa dos meneios e da nudez de Liliana e Ludmila. Uma
morena, outra loira, dois amores.
Informações sobre o autor no site http://www.joaocerqueira.com/
Informações sobre o autor no site http://www.joaocerqueira.com/
Posso dizer sinceramente que adorei a escrita. Parece-me muito promissor e interessante.
ResponderEliminarBoas leituras!
:)
Sem dúvida André. Fiquei muito ansioso para poder conhecer mais acerca deste autor.
EliminarEm breve teremos mais novidades por aqui :)
Enquanto isso, leia a segunda parte do excerto que já se encontra publicada :)
Boas leituras!
Depois de "A culpa é destas liberdades" e "A tragédia de Fidel Castro",Cerqueira volta a prometer mais humor corrosivo, sátira e bizarria. Depois deste pequeno apontamento estou curioso para ver o que se segue.
ResponderEliminarTeremos novidades em breve :)
EliminarDepois de ler este excerto, penso que este livro de João Cerqueira promete grandes momentos de leitura e divertimento para a nossa imaginação.
ResponderEliminarSem dúvida :)
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